No Limiar do Amanhã, um desafio no espaço.
Atenção, amigos ouvintes. Estamos no ar para dialogar. Chegou a hora do diálogo sobre os problemas fundamentais da vida e da morte, do destino e da dor. Atenção. Muita atenção, para o que vai dizer a nossa companheira Jurema Iara.
Sou Jurema Iara. Vocês todos me conhecem pela minha atuação nesse programa, nas transmissões esportivas da Rádio Mulher e em minha participação em várias outras atividades da nossa emissora. Os ouvintes de Araraquara e de Santo Antônio da Platina me conhecem, pelo menos, através de minha presença No Limiar do Amanhã. Tenho alguma coisa para dizer e que, ao menos para mim, é muito importante. Sinto-me muito alegre e muito feliz quando me dirijo a vocês neste programa. E por isso quero dizer agora, que No Limiar do Amanhã tem sido para mim um caminho de realização espiritual. Nunca eu havia pensado que se pudesse tratar assim, com tanta clareza e com tanta liberdade, de problemas tão sérios e tão graves através do rádio. Foi para mim uma surpresa e um deslumbramento poder participar deste diálogo livre em que tudo se pode dizer e discutir sem constrangimento, sem qualquer dificuldade. Acredito que a maioria de vocês pensa como eu. No Limiar do Amanhã é algo diferente, inteiramente novo. Um programa que empolga os que nele trabalham. Que nos envolve na sua atmosfera de esclarecimento espiritual. Sinto-me integrada nele e anseio pelo momento de vir até aqui e ocupar esse microfone para questões tão elevadas. Mas o que eu quero dizer é que vocês também precisam participar deste programa de maneira mais ativa. Todos vocês podem sentir-se integrados nele, como eu me sinto. Não façam apenas perguntas. Mandem também alguns textos escritos com amor, com vontade de colaborar, de levar aos outros, a mensagem pessoal de cada um. Contem seus casos, deem o seu testemunho, relatando suas experiências. Nós leremos ao microfone, os relatos que forem realmente importantes. E isso estimulará muitas outras pessoas a fazerem o mesmo. Este é um programa aberto a todos. Colaborem. É verdade que estamos agora sem os programas de auditório, mas logo mais voltaremos a eles.
Enquanto isso não acontece, vocês podem fazer o seguinte – prestem bem atenção no que eu vou dizer. Vocês mandam suas perguntas em uma folha de papel, escritas a máquina ou com letra bem legível e, noutra folha, contam um caso, uma experiência por que passaram. Se o caso for muito importante, nós chamaremos você para vir contá-lo de viva voz em nosso microfone. Então você participará do programa com sua própria voz. O que para nós será muito valioso. Tenho um caso particular para lhes contar, mas hoje não posso fazê-lo, voltarei em outro programa com mais tempo e mais calma. Então contarei o meu caso. E vocês verão que eu tenho muita razão para estar alegre e entusiasmada com esse programa. Por hoje é só, agradeço a atenção dos que me ouviram com paciência cristã. Agora passo a desempenhar o meu papel de locutora, tá?
No Limiar do Amanhã, um programa desafio. Produção do Grupo Espírita Emmanuel. Transmissão de número 157 – quarto ano. Locutores: Roberto Nei e Jurema Iara. Sonoplastia: Antônio Brandão. Técnica de som: José Nelito Alves. Direção e participação do professor Herculano Pires. Gravação nos estúdios da Radio Mulher São Paulo.
Diálogo No limiar do Amanhã. Porque sofremos? Porque morremos? Porque nascemos e vivemos neste mundo?
Pergunta 1: Por que Deus nos faz sofrer?
Locutor - Professor, pergunta a ouvinte Estanislava Grégori, da Avenida Angélica. Primeiro, não aceito a teoria da evolução pelo sofrimento. O sofrimento nos torna abatidos e amargos, nos faz piores. Por que Deus nos faz sofrer?
J. Herculano Pires – Na verdade, Deus não nos faz sofrer. Nós sofremos porque o processo evolutivo é naturalmente doloroso. A evolução hoje não é mais uma teoria. A evolução é uma verdade científica. É alguma coisa que está positivada pela investigação cientifica em todos os campos da Natureza. E nós podemos dizer que, não obstante não passem as coisas pelas condições humanas, as coisas também sofrem na evolução. O reino mineral evolui, o reino vegetal evolui, o reino animal também tem a sua evolução e o reino hominal, como nós sabemos, o reino do homem, é aquele em que a evolução culmina. Deus quer apenas que no processo evolutivo as coisas avancem, como dizia o doutor Gustave Geley, do inconsciente para o consciente. A evolução é o desabrochar de potencialidades ocultas nas coisas e nos seres. São as forças latentes que despertam.
Por exemplo, quando plantamos uma semente no solo, essa semente vai aos poucos, graças ao ambiente em que se encontra a excitação, a provocação dos elementos que a cercam, essa semente começa a germinar e dela sai uma árvore. Esta árvore ali existia, portanto, como um esquema, como um plano a ser realizado. Mas para realizá-la, quanto esforço foi necessário? A semente rompe a sua casca. Isto, no plano humano, nós consideraríamos como dor. E no entanto, no plano vegetal pensamos que não há dor. Não há dor como aquela que sentimos aqui no plano humano. Mas há um esforço, uma luta, uma batalha, para que a semente consiga romper a sua casca e dessa casca possa então brotar o germe. Germinar aquela planta que realmente vai se desenvolver. Tudo isto nós podemos considerar como sofrimento. Mas esse sofrimento nada é, diante da eternidade das coisas. Nada perece no mundo. Nada perece, tudo se transforma. No Universo inteiro, a vida canta vitoriosa sobre a dor, o sofrimento, a morte. Onde há morte há sempre uma passagem da vida de um plano inferior para um plano superior. Deus não quer que soframos e não nos faz sofrer. O processo evolutivo natural exige de nós e de todas as coisas um esforço contínuo para superação própria. Mas esta caminhada de superação é a busca da felicidade. Nós caminhamos para a felicidade, para a plenitude espiritual.
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Pergunta 2: Por que morrer muitas vezes?
Locutor - Segunda pergunta da mesma ouvinte, professor. Se temos de continuar a viver, por que morremos? Se Deus no fez imortais, por que nos faz passar pela morte em numerosas vidas? Isso me parece uma incoerência muito grande da Doutrina que o senhor professor, defende com muita lógica.
J. Herculano Pires – A Doutrina, na realidade, apenas reflete na sua estrutura conceptual, nos seus princípios, reflete a realidade. A Doutrina Espírita é baseada na pesquisa e na observação dos fenômenos. Assim, nós verificamos através dessa pesquisa e dessa observação, verificamos que o homem na sua essência é imortal. O seu Espírito sobrevive à morte e continua a agir depois da morte, inclusive em suas relações com o mundo dos vivos. Mas o que perece, o que é mortal, é o corpo material. Apenas isso.
Ora, pergunta a senhora, se o corpo material não deveria ser imortal. É preciso compreender aquilo que nós chamaríamos a dinâmica das formas. A forma se sucede no processo evolutivo. As coisas passam de uma forma para outra. A forma não pode ser sempre a mesma, não pode ser imortal. Porque ela marca apenas um momento transitório, um momento de passagem da evolução. Costuma-se dizer o seguinte. Quando o espírito de uma criatura humana desenvolveu-se de tal maneira nas experiências da vida terrena, conseguiu fazer com que muitas das suas potencialidades ocultas se apresentassem na realidade em todo o seu vigor, então este corpo não corresponde mais ao Espírito. É preciso que ele o abandone. Este corpo está superado. É velho para ele. Ele larga este corpo para usar outro, mais adequado ao seu novo grau de evolução e assim, sucessivamente.
De maneira que, neste progresso contínuo, nós temos a morte como apenas um fenômeno biológico. É o fenômeno da vida. Nós costumamos considerar a morte como a negação da vida e o Espiritismo nos mostra que a morte é simplesmente um fenômeno biológico. Houve, por exemplo, um grande fisiologista, Prêmio Nobel de Fisiologia, que foi Charles Richet. O grande fisiologista francês do início do século. Ele morreu em 1935. Richet escreveu em uma carta dirigida a Cairbar Schutel o seguinte: “a morte é a porta da vida.” Por que ele disse isso? Porque nas suas experiências de Metapsíquica, lidando com os fenômenos de materializações de Espíritos, Richet verificou que, na realidade, os espíritos continuam vivos após a morte e continuam mais livres e mais vivos do que quando aqui na Terra. Por isso, disse ele, a morte é a porta da vida. Pela morte, nós passamos para um plano superior da vida. A nossa visão da morte é bastante mesquinha e, por isso, nós nos aturdimos com ela. Mas no processo imenso em que se desenvolve o Universo, a inteligência de Deus está presente nas mínimas coisas.
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Pergunta 3: Espíritos privilegiados
Locutor - Professor, o ouvinte Marcelo Teodoro Dantas da rua Pinheiros, pergunta: Primeiro, se existem mundos melhores do que este, porque vivemos aqui? Deus tem os seus privilegiados, que vivem nos mundos superiores?
J. Herculano Pires – Também o senhor está encarando o problema dentro de uma concepção estreitamente humana, restrita inclusive ao condicionamento social em que nós vivemos. Não. Deus não é um chefe político. Deus não é um administrador de empresa que possa ter os seus privilegiados. Deus é a suprema inteligência do Universo, causa primária de todas as coisas. Ele é o Criador. Ele impulsiona, na sua criação, o desenvolvimento de todas as criaturas num mesmo e único sentido. Nós todos temos que evoluir, que progredir. Mas se nós aqui estamos na Terra e outras criaturas habitam mundos superiores, é porque nós ainda não atingimos na nossa evolução, a condição necessária para habitar nesses mundos mais elevados. A vida é uma ascensão contínua. Bastaria isto para nos mostrar a grandeza da vida e a grandeza do poder de Deus. A vida é uma ascensão incessante. Nós subimos desde os planos inferiores da Criação dos reinos inferiores até o homem. Nós subimos constantemente através da evolução. E quando chegamos ao homem, nós partimos para o plano superior que, no Espiritismo, chamamos de angelitude, quer dizer o plano dos anjos.
Os anjos não são mais do que os homens evoluídos, os Espíritos humanos depurados, aperfeiçoados. Os Espíritos humanos que se desprenderam dos planos inferiores da Criação e conseguiram desenvolver as suas potencialidades internas. Conseguiram desenvolver a sua inteligência, a sua afetividade, a sua vontade num plano extremamente superior, extremamente elevado. Então as religiões os chamam de anjos. Mas para nós, espíritas, estes anjos são só Espíritos puros, os Espíritos elevados que já se desenvolveram suficientemente. Na proporção em que os Espíritos se elevam, eles passam a habitar mundos superiores. Mas ninguém está privado de habitar esses mundos. Nós todos caminhamos para lá.
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Pergunta 4: Por que temos de renascer nesse mundo?
Locutor - Segundo: Por que temos de renascer neste mundo? Não progrediríamos melhor nos planos espirituais onde, segundo o Espiritismo, tudo é melhor?
J. Herculano Pires - A evolução é um processo contínuo. Nós temos de compreender o problema, não apenas através da nossa compreensão humana das coisas. Precisamos ir um pouco além. Precisamos compreender que estamos lidando com um processo universal, cósmico e que todo o cosmos está implicado neste processo. Assim, quando nós estamos aqui na Terra, passando por uma evolução necessária, é porque o nosso Espírito, dotado de potências que ainda não foram desenvolvidas, precisa da vida terrena, dos choques da vida material, do contato ainda com as condições dos reinos inferiores de que ele partiu. O senhor pode ler na Bíblia aquele trecho alegórico, bastante importante, que diz assim: "Deus fez o homem do barro da terra, do limo da terra." Ora, esta expressão nos coloca diante de uma verdade que o Espiritismo comprova pela experiência.
Deus tira o Espírito humano do principio inteligente do U, que é o motivo de organização e de estruturação de todas as formas da matéria, desde o reino mineral até o reino hominal. Assim sendo, este princípio inteligente tem potências que vão sendo desenvolvidas através desses reinos. Portanto, se nós ainda estamos aqui na Terra, é porque não temos condições, não poderíamos viver num mundo superior, onde as nossas percepções, a nossa vontade, a nossa inteligência, a nossa sensibilidade, não estariam em condições de se relacionar com as coisas circunstantes. Nós não teríamos sensibilidade para captar as sutilezas desse mundo, para perceber as coisas que nele existem e para conviver com seus habitantes. É por isso que continuamos a nos preparar na Terra, até que atinjamos a condição necessária para subir a mundos mais elevados.
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Pergunta 5: Necessidade dos médiuns
Locutor - A última pergunta do Marcelo, professor. Por que os Espíritos precisam de médiuns para dar comunicações? Se existe o fenômeno da voz direta, de escrita direta e até de gravação direta, por que eles não usam esses meios?
J. Herculano Pires – Se o senhor soubesse que todos esses meios são aplicados através de médiuns, o senhor compreenderia por quê. Quando falamos em voz direta, em escrita direta, em gravação direta, nós estamos falando de um processo através do qual o Espírito não se serve do médium como intermediário. Mas ele se serve do médium como fornecedor dos elementos vitais de que ele necessita, para influenciar a matéria do nosso plano. Vamos ver se explicamos isto melhor, de uma maneira mais clara. Nós, criaturas humanas, estamos envolvidos em matéria. A matéria do nosso corpo é animada pelo nosso Espírito. Mas no processo de animação desta matéria, desenvolve-se em nós o princípio vital. Este princípio vital pertence à matéria, à Terra. Os Espíritos libertos da matéria não têm princípio vital. Eles são a própria fonte da vida, mas como Espíritos. São Espíritos que animam o corpo. São as almas. Alma, como nós sabemos, de acordo com a expressão latina de que provém a palavra portuguesa, a expressão é anima. Estas almas são aquelas entidades que animam os corpos. Ora, sendo assim, o Espírito não pode comunicar-se, a não ser servindo-se do princípio vital, como intermediário entre eles e a matéria. E para servir-se deste princípio, eles precisam dos médiuns.
O senhor pode dizer. A gravação direta das vozes dos Espíritos, obtidas atualmente na Alemanha e, como sabemos, em numerosos outros países do mundo, a começar pela Suíça, onde se desenvolveu a pesquisa. Esta gravação direta exclui o médium. Mas o senhor está enganado. Porque o próprio Jurgensen, que realizou a primeira pesquisa nesse sentido é médium. O professor Konstantin Raudive, que hoje comanda na Alemanha a pesquisa nesse sentido, é médium. Então eles podem gravar com facilidade, obter a gravação de vozes dos Espíritos diretamente num gravador comum, de fitas magnéticas comuns. Eles podem obter isto, porque eles possuem o elemento essencial. Os recursos mediúnicos que eles fornecem ao Espírito, para que a gravação seja feita. É por esta razão, uma razão cientifica, que os Espíritos não podem manifestar-se diretamente. Eles têm sempre que comunicar-se com a criatura humana, que é o intermediário entre eles e as coisas na Terra.
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Pergunta 6: Deus nos criou para sofrer?
Locutor - Professor, a ouvinte Vera Regina Mitskof, da Rua Bartolomeu Feio, Brooklin, pergunta: Primeiro, um espírito que é criado por Deus, simples e ignorante tem condições para se tornar um espírito puro sem o sofrimento? Caso não tenha essa condição ou não nos for permitido saber, Deus então criou os espíritos indiretamente para sofrer? E, somente através do sofrimento, consequentemente evoluir? Ensinaram-me que o espírito foi criado para lutar e progredir e, não, para sofrer. Concordo que o sofrimento é derivado do abuso do nosso livre-arbítrio. Concordo que devemos lutar, trabalhar e sermos simples, nos contentando com nossas condições para não sofrer. Mas sendo, no caso de um espírito simples e ignorante, teria ele condições para lutar pela sua evolução sem, consequentemente, sofrer? Deus nos criou também para sofrer? Gostaria que o senhor me esclarecesse este assunto referente ao sofrimento.
J. Herculano Pires – É interessante que a senhora Vera Regina Mitskof vem tratar exatamente do problema colocado anteriormente pelos outros ouvintes. Mas isto é para nós bastante significativo, porque mostra o interesse que a Doutrina Espírita desperta em diversas pessoas, quase sempre levando no mesmo sentido para o esclarecimento de problemas. O espírito nascido simples e ignorante como nos diz O Livro dos Espíritos, é o espírito na sua origem. Eu já falei aqui do princípio inteligente do universo. O princípio inteligente do universo é, por assim dizer, uma substância do Universo. São duas, de acordo com o Espiritismo, as substâncias fundamentais: Espírito e Matéria. O Espírito é o elemento estruturador da matéria. A matéria existe disseminada no espaço. A matéria é como a areia que não tem possibilidade de se aglutinar por si mesma. É necessário que se coloque nela algum outro elemento, para que ela possa então produzir o barro ou a argila necessária. Este elemento é o espírito. O espírito atrai a matéria e estrutura, dá forma à matéria. Então nós caímos naquela teoria antiga de Aristóteles, a teoria de forma e matéria. Para Aristóteles todas as coisas eram estruturadas por uma forma espiritual. Esta mesma doutrina, nós encontramos em várias outras filosofias e também em várias doutrinas espiritualistas do mundo. Mas no Espiritismo, isto resultou, não somente de uma proposição teórica, mas também de experiências e investigações sistemáticas de ordem científica. Ora, o espírito como ignorante, simples e ignorante, é o espírito ainda na sua essência como o princípio inteligente que vai começar a se desenvolver, na proporção em que ele se apossa da matéria e a domina. De maneira que, assim considerando, nós compreendemos bem o problema. Na proporção em que o espírito simples e ignorante se desenvolve, ele adquire consciência de si mesmo. Mas no começo ele não tem consciência. Ele então é dirigido pelas forças da Natureza. É dirigido pelo próprio poder de Deus, que imprime a estas forças a direção necessária. E assim, o Espírito chega ao plano da consciência e só então ele recebe o livre-arbítrio.
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Pergunta 7: A necessidade da Educação Espiritual de nossos filhos.
Locutor – A segunda pergunta da Sra. Vera Regina Mitskof, Professor. Professor, gostaria que o senhor, se possível, falasse sobre a necessidade da educação espiritual de nossos filhos. Seja em casa ou em organizações apropriadas, para o seu cultivo moral de amanhã. O senhor não diz que a educação é a base para o equilíbrio do mundo futuro? Peço-lhe falar com toda a sinceridade que o assunto exige, pois algumas pessoas com quem convivo acham que a educação espiritual pode ser obtida depois, quando as crianças estiverem adultas. O senhor não acha mais difícil quando a idade já não é para estes assuntos?
J. Herculano Pires – É, há certas criaturas que pensam que a educação deve se dividir em duas partes contrárias. Existe a educação comum, a educação vulgar do mundo, em que se prepara a criança para a vida na Terra, para a vida entre os homens. Essa ninguém pretende dar depois que a criatura se tornou adulta. Procuram dar logo. E sendo logo, a criança na aprendizagem do alfabeto, no aprendizado de todas as coisas necessárias e na orientação moral de que necessitam para de fato, poderem viver no mundo. Mas, acham que a educação espiritual é outra educação e deve ser dada só depois de adulto. É muito estranho que se queira educar uma criatura depois que ela já cresceu. O tempo de educar já passou. É verdade que hoje nós temos a teoria da educação permanente. O homem se educa continuamente. Essa teoria vem a favor da Doutrina Espírita, quando sustenta que a nossa própria vida é um sistema de educação. Mas assim como existe a educação por si mesma, ou seja a educação natural, que o homem tem de enfrentar no seu desenvolvimento na vida, existe a educação sistemática ou formal, que é dada através de professores, de cursos, de escolas. É absurdo que se queira separar a educação espiritual da educação puramente social. A educação é um processo único. Ela tem por objetivo formar a criatura humana, formar o homem.
Ora, para formar o homem, não se pode tratar apenas de um dos seus aspectos. É preciso tratar de todos os aspectos globalmente. E é por isso que Kardec, que era um pedagogo, o que equivale a dizer-se um filósofo da educação, além de ser um professor, aplicado à prática do ensino na França, Kardec que era um discípulo de Pestalozzi, o maior pedagogo daquele tempo, do seu tempo, no século passado. Kardec insistiu na necessidade de educarmos as criaturas espiritualmente, ao mesmo tempo em que a preparamos para o desenvolvimento social. Vamos procurar esclarecer isso através de um esquema que talvez nos mostre tudo mais claramente.
Quando nós nascemos, nós somos um ser biológico, um ser vivo, simplesmente. Do ponto de vista humano. Do ponto de vista humano, que nós encaramos aqui na Terra, quando nós nascemos, como uma criancinha que acaba de nascer, somos um ser biológico. Mas este ser biológico traz em si a potencialidade necessária para se transformar em outros seres. O primeiro ser em que nós nos transformamos, ao crescer, é o ser social. A sociabilidade começa na família, depois se prolonga na escola e depois se desenvolve na vida social. Então existem dois seres. O ser biológico que nasceu e que depois se transformou no ser social. É o ser da comunidade, o ser do homem que vive na vida de relação com os outros. Mas este ser social tem por finalidade converter-se num ser moral. O ser moral é o homem que não apenas sabe conviver na vida social, de uma maneira vantajosa para ele, mas o homem que tem a intuição do seu destino espiritual e que busca sempre viver de maneira moralmente elevada. O ser moral é portanto a finalidade da educação.
Ora, como nós podemos desprezar os elementos que constituem já os germes da moralidade que estão naquele ser biológico que nasceu, desprezar esse germe de moralidade para só cuidar de lidar dos elementos necessários para o desenvolvimento do ser social. É necessário que encaminhemos a educação como um processo único. E este processo contínuo vai fazer de cada criatura humana, um ser moral. Se tivéssemos tido no mundo uma educação neste sentido completa, perfeita, nós não teríamos a situação verdadeiramente desastrosa em que hoje vivemos na terra. Porque cada ser moral seria um indivíduo íntegro, capaz de viver segundo os princípios mais elevados que cada um de nós traz na sua própria consciência.
No tocante ao problema espiritual, nós vemos que certas pessoas dizem o seguinte. As crianças devem ter o direito de escolher a sua religião. Mas quem pode tirar esse direito? Às crianças ou aos adultos? O fato de se criar uma criança dentro do catolicismo, ou dentro do protestantismo ou do budismo, não quer dizer absolutamente que ela vá ser católica, protestante ou budista por toda a sua vida. É grande o número de pessoas que, criadas numa determinada religião, mudam-se para outras. E, nós sabemos que cada religião representa um caminho espiritual adequado a certos tipos psicológicos. Entretanto, todas as religiões têm os mesmos fundamentos essenciais. Todas as religiões ensinam a existência de Deus, ensinam a imortalidade da alma e ensinam a necessidade do homem se elevar mental e espiritualmente para se aproximar daquele destino que lhe é marcado pelo Criador. Todas elas pregam os princípios morais fundamentais. Portanto, a criança deve ser educada, não só no tocante às matérias leigas, mas também no tocante as matérias religiosas, dentro da religião da família. E é por isso que nós sempre nos batemos dentro do Espiritismo, para o desenvolvimento da educação espírita. A educação espírita é uma necessidade tão grande como a educação católica, que já existe em suas várias formas, de acordo com as várias ordens que se dedicaram à educação. Como a educação protestante e como a educação clássica greco-romana foi necessária no seu tempo. De maneira que nós temos de considerar o seguinte. A criança é um ser que nasce no mundo com o destino que ela vai ter de cumprir e para o qual ela tem que se preparar. Os pais são os responsáveis pelo preparo desta criança. Se os pais a prepararem apenas de acordo com as necessidades da vida imediata na Terra, dando-lhe uma educação superficial, e referente apenas aos problemas imediatistas da vida, os pais estão negando a este ser a perspectiva maior do seu destino que é a continuidade da vida após a morte. O desenvolvimento do seu ser espiritual que é muito mais importante do que o simples ser social destinado a desaparecer como cada sociedade que desaparece. É preciso educar as crianças nos princípios religiosos. Isto é fundamental. Nenhum pai tem o direito, mesmo que seja ateu, de negar aos seus filhos esta educação. Quanto a opção, ao direto de escolher, isto pertence a cada um. A criança que se adaptar à religião do berço e nela permanecer por toda a vida, é porque necessitava desta religião. É porque esta religião, de fato correspondia ao seu tipo psicológico, às suas exigências conscienciais. Mas a criança que se rebelar contra a religião que lhe foi dada no berço e escolher outra, é porque esta criança encontrou nesta outra religião, os elementos mais adequados ao seu tipo psicológico. Aos elementos que correspondiam mais as exigências naturais da sua consciência. A escolha portanto só pode ser feita quando a criança estiver capaz de escolher.
Então por isto fazem a confusão, entendendo que a criança só deve ser educada religiosamente quando atingiu a capacidade de escolher. Nesse momento, não é o momento da educação. É o momento da opção, da escolha que ela vai fazer. Mas ela já tem a educação fundamental. A educação religiosa ela recebe em qualquer religião. Porque todas elas se baseiam nos mesmos princípios. Entretanto depois, nas interpretações subsequentes do desenvolvimento doutrinário é que ela vai encontrar as respostas ou não, às suas indagações mais profundas e é neste momento que ela vai escolher o seu caminho religioso. Mas para escolher este caminho religioso, ela já precisa ter em si os elementos essenciais da educação religiosa.
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Pergunta 8: Julgamento divino em uma única vida.
Locutor - Professor, o ouvinte Jurandir Grabovski, da Rua Augusta, faz as seguintes perguntas. Primeiro. Para o catolicismo e o protestantismo, temos uma só vida e por ela seremos julgados. O senhor acha isso absurdo, mas eu acho muito lógico. Se Deus tudo pode e nos concede uma só vida é porque essa vida é suficiente para ele nos julgar. O que o senhor responde a isso?
J. Herculano Pires – Me parece que é evidente a contradição desse princípio com a justiça de Deus. Se Deus é justo, ele não pode absolutamente submeter-nos apenas à experiência de uma existência passageira no mundo, para depois nos julgar de maneira definitiva e absoluta. É preciso o senhor considerar que o dogma não implica apenas o julgamento de Deus, mas também a condenação ou a absolvição. Ora, Deus vai nos julgar, de acordo com este princípio religioso, vai nos julgar para sempre, para a eternidade. E no que que ele se baseia? Numa vida fortuita, precária de apenas alguns anos na Terra. O que é uma vida humana, considerada com a eternidade? Comparada com a eternidade? O que é? Não é nada, um minuto. Então por um minuto julgamos em absoluto, de maneira decisiva um espírito e o condenamos ao tormento eterno. Ou lhe damos absolvição para a felicidade eterna. É isto que escapou ao senhor no seu raciocínio. Se o senhor pensar bem nisto, o senhor vê que Deus podia e pode realmente nos dar uma vida na Terra na hora em que ele quiser. Mas esta vida, nunca poderia ser, perante o seu senso supremo de justiça, que está muito além do nosso precário senso de justiça. Nunca poderia servir esta vida passageira, para um julgamento decisivo e absoluto que iria determinar para sempre e de maneira irrevogável o destino da alma.
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Pergunta 9: A reencarnação e a onipotência de Deus.
Locutor - Segunda pergunta. A doutrina das vidas sucessivas nega a onipotência de Deus. Supõe que ele não seja capaz de nos fazer perfeitos. A perfeição, neste caso, fica por nossa conta. Seremos por acaso mais poderosos que Deus?
J. Herculano Pires – Não. É evidente que não. Ninguém, penso eu, teria essa pretensão tola, a não ser um louco. Mas vamos analisar o problema. O senhor diz que Deus devia ou deve ter a possibilidade de criar-nos perfeitos. Não há dúvida nenhuma a respeito. Apenas eu queria lembrar ao senhor o seguinte. Deus nos cria perfeitos. Deus nos cria perfeitos, porque ele criou o princípio inteligente do Universo. E este princípio inteligente é uma projeção, por assim dizer, ou uma emanação da sua própria inteligência. É o seu próprio poder de inteligência que Deus, por assim dizer, projeta no Universo para dele arrancar as criaturas, para dele fazer que nasçam as criaturas. Cada criatura portanto tem dentro de si uma porção de Deus. Esta porção de Deus está no princípio inteligente e vai formar a consciência da criatura. Ora, esta porção de Deus que está na criatura é perfeita em si mesma. É perfeita em si mesma. Já traz todas as suas potencialidades, as potencialidades angélicas que vão se desenvolver no futuro. Mas cabe à criatura desenvolver essas potencialidades através da experiência. Por quê? Porque sem a experiência necessária, a criatura ao desenvolver as suas potencialidades, não saberia realmente como conduzi-las ou dirigi-las de maneira eficiente, de maneira eficaz ao seu próprio progresso.
Vejamos o seguinte. Já usamos tantas vezes aqui a imagem da semente e da árvore. A árvore está na semente perfeita. Todo o plano da árvore ali está. Se o senhor planta um semente de girassol, não pode nascer uma laranjeira. Por quê? Porque o plano que está dentro daquela semente, que Deus ali colocou, por assim dizer, não nos esqueçamos nunca de que essas expressões são alegóricas. Deus ali colocou, foi o plano da semente de laranjeira. Então se plantamos a semente de girassol não dá laranjeira e vice-versa. Mas se plantamos a semente de laranjeira e ela germina, nós temos a laranjeira. A laranjeira pode apresentar defeitos, pode ter imperfeições decorrentes da sua estrutura material. Mas o seu plano divino, interior é perfeito. Assim é o homem. O homem é perfeito em si mesmo. Mas no processo evolutivo, a fim de que ele domine as suas potencialidades, afim de que ele consiga estruturar a sua consciência de maneira positiva, ele tem de avançar no tempo. O tempo é o grande laboratório da evolução. E a evolução não é nada mais do que desenvolvimento de potencialidades, ou seja de poderes ocultos no espírito. Estes poderes estão ocultos, mas estão ali vivos, presentes, inalienáveis, indestrutíveis. Portanto, o ser humano em si mesmo é perfeito. Mas para que ele atualize esta perfeição - atualizar quer dizer transformar de potência em ato - para que ele atualize esta perfeição, ele tem que passar pelo processo evolutivo. Mesmo porque, é neste processo que ele vai, não apenas se desenvolver, mas também assenhorear-se de todos os seus poderes e aprender como dirigi-los, como usá-los.
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Abrimos o Evangelho ao acaso e saiu o seguinte. Lucas, 24:44-49.
“Depois lhes disse: estas são as palavras que eu vos disse quando ainda estava convosco. Que importava se cumprisse tudo o que de mim estava escrito na lei de Moisés, nos profetas e nos Salmos. Então lhes abri o entendimento para que compreendessem as Escrituras. E disse-lhes: assim está escrito que o Cristo padecesse e ressurgisse dentre os mortos ao terceiro dia. E que em seu nome se pregasse arrependimento para remissão dos pecados, a todas as nações, começando por Jerusalém. Vós sois testemunhas dessas coisas. Eis que vou enviar sobre vós a promessa de meu Pai. Mas vós permaneceis na cidade, até que sejais revestidos de poder lá do alto.”
J. Herculano Pires – Nós vemos nessa passagem do Evangelho de Lucas, um dos episódios mais tocantes do Evangelho. E, ao mesmo tempo, um dos episódios mais importantes para a interpretação espírita do Evangelho. O Jesus que está falando neste trecho é o Jesus espírito ressuscitado, depois da morte, portanto. Trata-se, portanto, de uma comunicação espírita, aqui transcrita. Aqui no Evangelho. Jesus, como espírito, fala aos seus discípulos e lhes indica algumas coisas importantes. Por exemplo, manda que eles permaneçam em Jerusalém, que permaneçam no cenáculo, que era a sala de reuniões que eles usavam para fazer preces, cantar louvores a Deus. E que ali permaneçam até que ele possa (ele, Jesus) mandar sobre eles a promessa do Pai. Esta promessa do Pai, Jesus havia já dito anteriormente quando encarnado, quando na sua encarnação terrena. Ele dissera que pediria ao Pai, que é Deus, e o Pai enviaria aos homens o Espírito da Verdade, o Consolador, o Paráclito. Que teria por finalidade lembrar tudo aquilo que ele havia ensinado. E ensinar ainda aos homens outras coisas que eles, naquela ocasião, não tinham capacidade para compreender. Vemos assim confirmado neste trecho de Lucas, o trecho precisamente anterior, imediatamente anterior à ascensão de Jesus em Betânia. Vemos Jesus falando como um Espírito materializado. Como um espírito no seu corpo perispiritual, mas tornando-se visível aos apóstolos. Podendo ser tocado, podendo falar com eles. E ao dizer isto, Jesus anuncia que a vinda do Consolador, a vinda do Espírito da Verdade, seria a abertura, por assim dizer, da mediunidade no mundo. A mediunidade sempre existiu, mas não a mediunidade realmente orientada no sentido da espiritualização do homem. E esta mediunidade começou quando? Quando, após a morte de Jesus e a sua ressurreição, os apóstolos reunidos no cenáculo em Jerusalém, passaram pelo dia de Pentecostes. Ou seja, o dia em que as línguas de fogo baixaram sobre a cabeça dos apóstolos e eles começaram a profetizar em várias línguas. Falando a multidão que os cercava nas línguas diversas de todas aquelas pessoas que ali se encontravam, porque ali, na Jerusalém cosmopolita, havia pessoas das mais diversas línguas. É o fenômeno que no Espiritismo se chama de xenoglossia, de falar línguas estranhas dos médiuns, que podem falar línguas estranhas que não conhecem. Assim, vemos que tudo aqui confirma a Doutrina Espírita através de uma comunicação de Jesus depois da sua morte. Além disso, nós vemos, logo em seguida a esse trecho, o problema da ascensão de Jesus. Nós sabemos que as igrejas cristãs consideraram que Jesus subiu ao Céu, depois da ressurreição, com o seu próprio corpo material. No Espiritismo, entretanto, dizemos o contrário. Jesus subiu ao Céu com seu corpo espiritual. O corpo material não pode subir ao Céu, porque o Céu, entendido como um plano superior da espiritualidade, não comporta matéria densa, condensada, grosseira, que constitui o corpo humano na Terra. Assim, vemos que Jesus se eleva diante dos apóstolos e desaparece no Céu. Mas não é o Jesus corporal, é o Jesus espiritual. É o espírito de Jesus no seu corpo perispirítico, como dizemos no Espiritismo, que se afastava da Terra naquele momento, para retornar ao plano superior da sua vida.