Jorge Rizzini: divulgação e defesa de Kardec em várias frentes.
Filho de Cecilia T. Rizzini e Joaquim V. de A. Rizzini, o paulistano Jorge Rizzini nasceu em 25/9/1924 em uma família espírita. Viveu sua infância e parte da adolescência no Rio de Janeiro, tendo cursado o primário e o ginasial – equivalentes ao 1º Grau – nessa cidade.
Os primeiros sinais de sua mediunidade apareceram na infância. Aos dez anos, conseguia aliviar as dores que acompanhavam sua mãe há muito tempo.
Ainda jovem, já havia estudado várias obras de Allan Kardec e demonstrando grande admiração pela Filosofia Espírita.
Por volta dos dezessete anos, sua mediunidade aflorou e ele passou a frequentar um centro espírita que, à época, ficava próximo à Federação Espírita do Estado de São Paulo (feesp).
Casou-se com Iracema Sapucaia, pedagoga e autora dos livros infantis doutrinários como
O besouro Cascadura, Aventuras de Fraterninho (Ed. Correio Fraterno), Iriê (Ed. celd) e outros. É irmão do cientista Carlos Toledo Rizzini, autor do livro Evolução Para o Terceiro Milênio (Ed. Edicel).
O INÍCIO DE UMA AMIZADE
O ano de 1950 marca o início de sua participação ativa no movimento espírita brasileiro, em que contribuiria com a realização de trabalhos que tinham por objetivo a divulgação ou a defesa da obra de Allan Kardec.
Em 1952, na cidade de São Paulo, na tradicional Livraria Teixeira, ponto de encontro de escritores e poetas, Jorge Rizzini conheceu Herculano Pires. Rizzini tinha 28 anos e Herculano, 38 – exatamente dez anos, a diferença de idade entre eles, já que ambos nasceram no dia 25 de setembro: Herculano em 1914 e Rizzini, em 1924.
Esse encontro definiu o caminho que ambos seguiriam juntos, durante trinta anos, na defesa e divulgação da obra de Allan Kardec.
OS “CLÉRIGOS DO UMBRAL”
Herculano e Rizzini enfrentaram vários adversários da doutrina de Kardec, em debates pela televisão.
Como Frei Albino Aresi ficou rico com suas instituições “parapsicológicas”, situadas em diversos Estados do Brasil. Embora negasse a influência dos espíritos sobre a matéria, vendia a preço de ouro vários objetos cabalísticos (pirâmides, pulseiras etc.).
Irmão Vitrício empregava a letargia, ludibriando o público ao afirmar que o estado letárgico não era uma consequência da hipnose.
Porém, segundo Rizzini (em livro), "o mais agressivo e sarcástico nas declarações à imprensa, contra a mediunidade e a Doutrina Espírita”, foi o padre espanhol Oscar González Quevedo, também proprietário na capital paulista de um instituto de 'Parapsicologia'.
Rizzini concluiu:
“Mas podemos afirmar [...] que os espíritos escrevem certo por linhas tortas. Porque o padre Quevedo com sua tropa, ao atacar com mentiras o médium Arigó e, com tamanho ímpeto, o espiritismo durante quase quarenta anos, fizera com que o movimento espírita se expandisse ainda mais de norte a sul do Brasil. Os clérigos despertaram a curiosidade do povo para a fenomenologia espírita. Notem os leitores este exemplo. Quando Quevedo iniciara a campanha que parecia demolidora, existiam no país, apenas, três ou quatro editoras espíritas. Décadas depois elas somaram, aproximadamente, uma centena. O tiro quevediano, pois, saiu pela culatra.”
A DEFESA DO MÉDIUM ZÉ ARIGÓ
Rizzini e Herculano fizeram parceria na defesa de Arigó, em debates, principalmente com os opositores Rui Melo (psiquiatra) e Cesário Morey Hossri (professor de psicologia da Universidade Católica de Campinas) e João Beline Burza (psiquiatra).
Herculano escreveu para Carlos Imbassahy (pai), seu companheiro de luta do Rio de Janeiro, para posicioná-lo de como estava se desenvolvendo o trabalho, que realizava, em parceria com Rizzini, em São Paulo:
Imbassahy, Rizzini e eu estamos aqui em uma luta brava. Toda quarta-feira, no canal da TV Cultura, enfrentamos debates sobre Espiritismo. Primeiro recebemos uma turma de pastores da idade do barro, conseguimos exorcizá-los.
No programa seguinte vieram uns médico-hipnólogos, esses no primeiro round entregaram os pontos e depois dos hipnólogos vieram os rabinos! É um inferno em vida! Mas o Rizzini me disse que a nossa dupla é do barulho e que pode vir até o próprio Diabo em pessoa! O rapaz é corajoso, e eu o acompanho enquanto posso.
Sobre a campanha de Rizzini em defesa do médium Zé Arigó, escreveu Carlos Imbassahy em Mundo Espírita (1963):
Rizzini é o cavaleiro andante em busca da verdade que aponta, arrojada e destemerosamente, visto que para proclamá-la é necessário muitas vezes possuir coragem e afrontar o preconceito, tão temível ainda quanto o era há alguns anos. Rizzini deu-nos neste valoroso trabalho, um grande alento, por ver que ainda há quem não poupe esforços, embora com grande sacrifício de tempo e pecúnia, para fazer justiça e trazer luz num grande acontecimento como o Caso Arigó.
RIZZINI NO CLUBE DOS JORNALISTAS ESPÍRITAS
Bastante jovem iniciou sua carreira de jornalista, tendo passado pelo jornal Diário de S. Paulo, pelas revistas Planeta, Edição Extra e Quincas Borba, assim como pela TV Cultura de São Paulo e pela extinta TV Continental do Rio de Janeiro. Dizia sempre que “a força de um jornal está, antes de tudo, em seus repórteres. O resto vem depois.”
Em 1959, Rizzini presidiu o Clube dos Jornalistas Espíritas do Estado de São Paulo; lançou nesse mesmo ano o Kardequinho, a primeira revista infantojuvenil espírita o “Pai da Parapsicologia Moderna” e foi membro do Colégio Argentino de Estudos Psíquicos.
Filmou na França e nos Estados Unidos, documentários sobre Allan Kardec e as irmãs Fox. Registrou, com exclusividade, as cirurgias realizadas por Arigó e os trabalhos mediúnicos de Francisco Cândido Xavier; foi pioneiro na apresentação de um programa espírita na televisão, em 1966 – “Em Busca da Verdade” – primeiro programa espírita da televisão brasileira, programa semanal de uma hora e meia, na TV Cultura de S. Paulo.
RIZZINI ESCRITOR: ESTUDOS, DRAMATURGIA E OBRAS MEDIÚNICAS
Sua produção literária, com quase três dezenas de títulos publicados, abarcou ficção, dramaturgia, biografia e ensaio.
A estreia literária, em 1951, foi com a novela "Carlito e os homens da caverna”, mas a consagração como ficcionista veio com o livro de contos Beco dos aflitos, em 1957, ganhador do Prêmio Fábio Prado da União Brasileira de Escritores. O crítico Brito Broca, logo após o lançamento da obra, escreveu no Correio da Manhã, do Rio de Janeiro: “E devemos reconhecer que Jorge Rizzini sabe objetivar em termos romanescos os angustiosos problemas, cuja solução propõe, não havendo nessas páginas uma nota que soe falso.”
Ênio Silveira, editor de Beco dos aflitos, assim que acabou de ler os originais, declarou que estava impactado com a influência de Dostoiévski. O escritor Adonias Filho, no Jornal do Comércio salientou: “A preocupação, a que não falta a sombra dostoievskiana como demonstram os contos “O subterrâneo” e “Um homem murcho”, é essa de atingir a consciência em conflito para mostrá-la em sua significação clássica.”
Outros destacados nomes da crítica literária daquela época,como Antônio D’Elia, Rolmes Barbosa, Waldemar Cavalcante e Antônio Olinto foram unânimes em observar a linhagem do autor de Crime e castigo a que o então jovem autor se filiava.
Seu livro Materializações de Uberaba, segundo Chico Xavier, “foi escrito com suor e sangue”. Sobre as polêmicas com os repórteres da revista O Cruzeiro, em torno das materializações, escreveu Deolindo Amorim, em A Nova Era, edição de 15 de agosto de 1964:
Poucos, na realidade, teriam a coragem e o espírito de renúncia que teve Jorge Rizzini para enfrentar, na televisão, todos os desafios que ele enfrentou em defesa, não apenas do caso em si, mas em defesa do Espiritismo. Escritor e jornalista brilhante, uma das mais vigorosas culturas do movimento espírita brasileiro, Jorge Rizzini é também espírita de ação, e já o demonstrou principalmente nesta última campanha. Ainda que haja este ou aquele ponto sobre o qual possam pairar dúvidas na parte técnica das materializações, o que não se pode negar, diante dos testemunhos e depoimentos, é o desassombro, é a convicção, é o idealismo de Jorge Rizzini.
Para o teatro escreveu A cidade perdida, premiada pelo Conselho Estadual de Cultura de São Paulo. Escreveu ainda A visita e A terceira revelação.
Ensaísta profícuo, deixou um pioneiro estudo sobre o comportamento sexual nos presídios, que intitulou O sexo nas prisões, merecedor de elogiosas críticas de especialistas na área.
De sua lavra também foi o primeiro estudo mais alentado sobre o famoso médium mineiro José Arigó, figura de larga repercussão nos meios jornalísticos, nos anos 1960.
No instigante Escritores e fantasmas, estudou a relação de diversos escritores com o sobrenatural. Da obra, participam figuras célebres da literatura mundial, relatando momentos de suas vidas, em que protagonizaram surpreendentes fenômenos espirituais. Estão ali Leon Tolstói, Goethe, Vitor Hugo, Monteiro Lobato e Rui Barbosa, entre outros.
DIVULGANDO O ESPIRITISMO NO EXTERIOR
Jorge Rizzini divulgou o espiritismo também no exterior. Em Londres, foi entrevistado pela BBC e alguns de seus filmes foram exibidos na Federação Espírita da Inglaterra e na residência do célebre químico Julian Huxley, então Secretário Geral da Unesco, estando presente, o embaixador do Brasil.
Rizzini é citado nos seguintes livros norte-americanos: Uri Geller de Andrija Puharich, Arigó, surgeon off the rusty knife de John Fuller, e também nas revistas de circulação mundial Seleções do Reader Digest, Oggi, e Planète (edição francesa).
Manteve correspondência com J. B. Rhine, o “Pai da Parapsicologia Moderna” e foi membro do Colégio Argentino de Estudos Psíquicos.
MILITÂNCIA DOUTRINÁRIA
Espírita militante, palestrante conhecido sobre a doutrina que abraçou, foi colaborador de vários jornais e revistas doutrinários. Nunca deixou de questionar o excessivo misticismo e os descaminhos do movimento espírita nas últimas décadas, com o surgimento de um sem-número de pseudopsicógrafos e pintores mediúnicos.
A folha de serviços prestados por Jorge Rizzini ao movimento espírita é extensa, que vão muito além das sua produção literária.
DISCOGRAFIA E MÚSICAS MEDIÚNICAS
Em 1977 criou o selo “Sol Maior” e lançou dois discos: A vida maravilhosa de Chico Xavier e a Vida missionária de Allan Kardec, cujos textos teatralizados, de sua autoria, foram interpretados por famosos atores da televisão.
Um fato interessante na vida de Rizzini é quanto à sua mediunidade musical: seu espírito-guia Manuel de Abreu lhe havia prometido músicas do Além. Ele, em certa noite, ouviu, na penumbra do seu quarto, uma voz dizer: “Lamartine”. Rizzini pensou que fosse o escritor francês que estava ali. Porém, a voz acrescentou – “Babo”. E logo a seguir entrou no quarto o espírito de Ataulfo Alves e ambos começaram a cantar uma música em que um complementava o outro, numa letra sobre a imortalidade da alma.
Suas filhas disseram que Rizzini era uma pessoa determinada. O melhor exemplo disso, foi quando, intuído por Manuel de Abreu, resolveu realizar o Festival de Música Mediúnica no Teatro Municipal de São Paulo, em 1982, que reuniu mais de duas mil pessoas.
Seu objetivo era fazer a divulgação de músicas mediúnicas diversas, psicografadas por ele mesmo, que traziam na sua mensagem a comprovação da imortalidade do espírito.
Rizzini não tinha nenhum conhecido para apresentá-lo aos responsáveis por autorizar a sua realização. No planejamento, porém, tudo parecia se encaixar. Era perceptível a colaboração dos espíritos.
Batendo em várias portas, enfim conseguiu a referida autorização. Em seguida, contatou os artistas que aceitaram participar gratuitamente de tal evento. O resultado de seu esforço foi a realização de um espetáculo histórico no referido teatro.
Em 1983, realizou o segundo Festival de Música Mediúnica no Palácio de Convenções do Anhembi de São Paulo. O terceiro teve lugar no Ginásio de Esportes do Ibirapuera e o quarto, no Teatro Imprensa, também na capital paulista. As músicas recebidas por Rizzini e interpretadas por cantores profissionais foram gravadas em três long-plays intitulados Compositores do Além (I, II e III) e no DVD Compositores do Além, produzido pela Versátil Home Video. Eventos semelhantes aconteceram em Salvador, Campinas e Rio de Janeiro.
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OBRAS DE JORGE RIZZINI
Beco dos Aflitos (contos). Rio de janeiro: Civilização Brasileira, 1959. Obra laureada pela União Brasileira de Escritores: “Prêmio Fábio Prado”.
O Sexo nas Prisões. São Paulo: Nova Época, 1976. (com parecer do Procurador da República). Estudo jurídico.
Eurípedes Barsanulfo, o Apóstolo da Caridade (biografia). S. B. do Campo: Correio Fraterno, 1979.
Caso Arigó (documentário). [S l.]: Supertipo, 1983.
Escritores e Fantasmas (documentário histórico). S. B. do Campo: Correio Fraterno, 1992.
Kardec, Irmãs Fox e Outros. Capivari: EME, 1995.
O Regresso de Glória (contos). São Paulo: Nova Luz, 1996.
Materializações de Uberaba (documentário). São Paulo: Nova Luz, 1997.
Otília Diogo e as Materializações de Uberaba. São Paulo: EDICEL, [s. d.].
A Verdade sem Véu. [Não publicado]
Imortalidade. [Não publicado]
Literatura infantojuvenil
Carlito e os Homens da Caverna (novela). São Paulo: Brasiliense, 1951.
Vida de Monteiro Lobato. S. B. do Campo: Correio Fraterno, 1998.
Histórias de Dona Santinha (contos). São Paulo: Piratininga, [s. d.].
Literatura teatral
A Cidade Perdida – Peça laureada pelo Departamento de Cultura do Estado de São Paulo: “Prêmio Narizinho”.
A Terceira Revelação: A visita. São Paulo: Nova Luz, 1999.
Biografias sonoras
A Vida Missionária de Allan Kardec e a Vida Maravilhosa de Chico Xavier (textos teatralizados em CD). São Paulo: Nova Luz, [s. d.].
Obras psicografadas
Antologia do Mais Além. São Paulo: Lake, 1973.
Castro Alves Fala à Terra. São Paulo: Instituto Maria, 1987.
Sexo e Verdade. S. B. do Campo: Correio Fraterno, 1988.
Guerra Junqueiro no Aquém e no Além. São Paulo: Instituto Maria, [s. d.].
Músicas mediúnicas
Compositores do Além. vol. 1. Fita K-7 com músicas populares brasileiras. Capivari: EME, [s. d.].
Compositores do Além. vol. 2. LP com músicas nacionais, argentinas e norte-americanas. CD. São Paulo: USE, [s. d.].
Compositores do Além. vol. 3. LP com músicas líricas italianas. CD. São Paulo: USE, [s. d.].
Marchas Mediúnicas. CD. São Paulo: Correio Fraterno, [s. d.].
Melodias do Além. CD. São Paulo: FEESP, [s. d.].
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Imagens: Acervo da Fundação Maria Virgínia e J. Herculano Pires