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LEMBRANÇA DO CRISTO
Francisco Cândido Xavier
Nossa reunião pública do dia 14* foi consagrada às comemorações do Natal. O evangelho segundo o espiritismo ofereceu aos nossos estudos e reflexões o item 5 do capítulo VI. Nossa amiga d. Maria Eunice Lucchesi, de São Paulo, comentou o texto com muito carinho e eficiência, lembrando a mensagem evangélica que a doutrina espírita encerra para o mundo.
Ao término de nossas tarefas, nossa irmã do plano espiritual, Maria Dolores, escreveu a mensagem que lhe envio, em plena lembrança do Cristo, nos dias presentes. Envio essa página na esperança de que possa figurar no Diário de S. Paulo com os seus apontamentos.
Desde já muito agradeço a sua generosa cooperação de sempre ao prosseguimento de nossos estudos.
* Reunião pública da Comunhão Espírita Cristã, na noite de 14/12/1974, em Uberaba, MG.
ORAÇÃO POR NÓS
Maria Dolores
Senhor!
Sabemos nós que nos dissestes:
“– Amai-vos uns aos outros,
Tal qual eu vos amei.”
Todos estamos certos quanto à lei
Que em ti refulge sob a luz celeste
– a luz do Eterno amor.
Entretanto, Senhor,
Os nossos raciocínios
De fé e aceitação
Sempre desaparecem no barulho
Da vaidade e do orgulho
Em que nos mergulhamos com frequência,
Ensombrando a existência
Ao recusar-te o coração.
É por isto, Jesus,
Que te rogamos luz
Para rever-te a vida e escutar-te os chamados
Nos companheiros desesperançados,
Nos últimos das filas
Das multidões cansadas e intranquilas
De que passamos ao redor,
Das quais nos chamas à cooperação
Por um mundo melhor.
Sabemos que nos falas
Através das crianças desnutridas,
Das mães que lutam por alimentá-las,
Dos enfermos que esperam
A vaga do hospital,
Dos irmãos outros de outros sanatórios,
Daqueles nosocômios diferentes,
Onde a justiça guarda os corações doentes
Que pulsaram no bem, vezes e vezes,
E atiraram-se ao mal...
Temos nós a certeza
De que nos buscas, dia a dia,
Nos que esmorecem de tristeza,
Dos que se vão na estrada escura e fria
Da deserção que os desconforta,
Naqueles cujo peito
Inda nutre a esperança quase morta,
De pés sangrando no caminho
Das grandes provações...
Conhecemos a luta em que te pões,
Pedindo-nos concurso e entendimento,
A fim de atenuar o sofrimento
De tantos corações
Atolados na sombra em velhos climas
De rebeldia, angústia e indiferença,
Companheiros dos quais nos aproximas,
Agora e em toda parte,
A fim de interpretar-te
A divina presença.
É por isto, Senhor, que te imploramos:
Faze-nos olvidar as bagatelas
Entre as quais nos perdemos...
Arreda-nos do passo todas elas
De modo que possamos entender
O serviço contigo por dever.
Ajuda-nos, Senhor,
A lembrar-te e a esquecer
Tudo quanto se ligue a pensamento vão,
Para que o nosso amor jamais se torça,
Porque somente em ti, Jesus, existe a força
Que nos leve a entregar-te o coração.
SABER AMAR
Irmão Saulo
Às vésperas do Natal, a poetisa Maria Dolores nos lembra o mandamento do amor. Se o houvéssemos obedecido, a Terra seria hoje um mundo tranquilo e feliz. Como não fomos capazes de segui-lo, vemo-nos envolvidos em lutas inglórias e submetidos a terríveis ameaças. Quando Jesus advertiu os discípulos contra o fermento dos fariseus, eles entenderam que o Mestre lhes falava de pão. Dois milênios depois fazemos o mesmo. O fermento do orgulho e da vaidade nos leva a desfigurar os seus ensinos e rejeitar as suas palavras. Somos alunos repetentes de muitos séculos!
O item 5 do capítulo VI de O evangelho segundo o espiritismo, citado por Chico Xavier, constitui-se de uma mensagem do Espírito da Verdade, que há mais de um século repetiu-nos, como porta-voz de Cristo, o seu ensino esquecido: “Espíritas, amai-vos, eis o primeiro ensinamento; instrui-vos, eis o segundo”. A mensagem é dirigida aos espíritas, na era da razão, porque eles devem estar em condições de compreendê-la.
Não basta amar, é preciso saber amar. Jesus não nos trouxe apenas o amor, mas também a verdade. Ensinou-nos a raciocinar, a buscar o sentido da vida, a não nos perdermos de novo nas trevas da vaidade farisaica. Por isso o Espírito da Verdade acentua: "Instrui-vos".
O espiritismo é a Renascença cristã, segundo a bela definição de Emmanuel. Inicia na Terra uma fase nova da Ilustração, de Iluminismo, desalojando a nossa mente do fanatismo sectário. No Renascimento tivemos a iluminação das ciências. No espiritismo temos a iluminação da verdade, sob as luzes conjugadas da ciência, da filosofia e da religião.
Não temos o direito de nos perdermos de novo em jogos de palavras, como fizeram os sofistas gregos, os rabinos judeus, os clérigos medievais. Não temos o direito de corrigir os textos de Jesus e Kardec segundo a medida estreita de nossa miopia mental. Precisamos instruir-nos, arejar-nos, libertar-nos dos preconceitos para não confundirmos o fermento do passado com o pão de cada dia que o padeiro nos entrega.
A prece de Maria Dolores é um convite de Natal à compreensão profunda das lições do Mestre, à rejeição “das bagatelas entre as quais nos perdemos”, como crianças que brincam com os seixos da praia sem compreender a extensão e a profundidade do mar.
Abençoada lição que nos dá a grande poetisa do além: deixemos de lado os bilros das palavras e cuidemos do sentido real dos ensinos de Jesus, pondo-nos em prática na realidade da vida. Neste Natal, o Mestre nos olha compassivo, perguntando a si mesmo até quando continuaremos apegados à ilusão dos sofismas, tentando corrigir os seus ensinos.