No Limiar do Amanhã, um desafio no espaço.
Estamos no ar para dialogar. Esse programa é um diálogo radiofônico da era da comunicação, um programa livre que só tem compromisso com a verdade. Não queremos convencer ninguém. Não somos pregadores, somos expositores. Acreditamos nessas palavras do Cristo: a verdade vos libertará.
Mas sabemos que na Terra ninguém possui a verdade plena. Os que pensam possuí-la são criaturas sistemáticas ou fanáticas. Se você acha que estamos errados, auxilie-nos com a sua verdade. A verdade tem as dimensões do universo e cada um de nós possui apenas uma porção de verdade. Mande-nos a sua verdade, e se ela resistir à lógica e ao exame dos fatos, ficaremos com ela. Pilatos perguntou a Cristo: o que é a verdade? Mas o Cristo não lhe respondeu. O poeta Cleómenes Campos explicou num verso, foi como se ele dissesse: a verdade sou eu. Você concorda com isso, amigo ouvinte, ou você acha, como nós, que o Cristo não respondeu, porque a sua verdade não cabia na mente ambiciosa do legado de César? Para Pilatos a verdade era o poder humano. A busca da verdade é a busca de nós mesmos, porque a verdade está em nós, em nosso coração e em nossa consciência. Mas como Sócrates ensinou, precisamos arrancar a verdade do fundo de nós mesmos. O Cristo perguntou aos judeus: não está escrito em vossas escrituras? Vós sois deuses? Nós, todos nós somos criaturas divinas criadas por Deus, somos herdeiros de Deus e coerdeiros do Cristo, como ensinou o apóstolo Paulo.
A busca da verdade é a busca de nós mesmos e o caminho da verdade é o diálogo sobre a verdade. Estamos no ar para dialogar. Propomos a todos a busca da verdade através do diálogo. Ajude-nos a encontrar o diálogo maior sobre a natureza humana e o destino do homem, o destino de todos nós. Não tema buscar a verdade, porque foi para isso que Deus nos concedeu a inteligência e a razão.
No Limiar do Amanhã, um programa desafio. Transmissão número 146, terceiro ano, direção e participação do professor Herculano Pires.
Perguntas e respostas. Pergunte o que quiser, mas não misture pergunta e carta. Faça as perguntas em papel separado. Pergunta nº 1: Nosso Lar
Locutor - Professor, nosso ouvinte A. do N., da Rua dos Sitiantes, Freguesia do Ó, pergunta: gostaria de saber o seguinte, no livro de André Luís, Nosso Lar, André Luís descreve hospitais, casas e jardins. Quero saber mais ou menos em que ponto da Terra estão situadas essas construções.
J. Herculano Pires - Essas construções não estão situadas na Terra, quer dizer, na parte sólida da Terra que nós vivemos chamada crosta terrena. Nós sabemos que o planeta, como todos os demais corpos celestes, possui várias faixas de matéria em diversas densidades. Assim, além dessa esfera sólida em que nós estamos, existem outras esferas que circundam a Terra, são os espaços destinados a outros mundos dentro da própria Terra. Assim, o que André Luís descreve é uma cidade espiritual. Essa cidade existe naturalmente na própria atmosfera terrena, se assim podemos chamar, mas é evidente que ela está acima daquilo que nós consideramos atmosfera material da Terra. É um envoltório, uma segunda camada de matéria, mas infinitamente mais rarefeita do que essa matéria que nós conhecemos na vida material nossa. Então, essa matéria sutil é que constitui um plano espiritual ainda próximo da Terra, ainda apegado por assim dizer, aos sistemas, aos usos, aos hábitos do planeta. Na verdade, todos os sistemas, usos e hábitos que aqui temos decorrem de influenciação dessas áreas superiores da vida planetária, de maneira que o senhor não poderia nunca encontrar essa cidade, a cidade chamada Nosso Lar, nem as suas construções e os seus jardins em qualquer ponto geográfico da Terra. O senhor só poderia encontrar isso quando, após a sua desencarnação – não se assuste, eu não estou prevendo a desencarnação para o senhor, é que nós todos vamos desencarnar um dia. Após a sua desencarnação, o senhor penetrasse nesse outro mundo que é o mundo espiritual. Ora, mas ainda quando vivo, encarnado, o senhor poderia em sonho também chegar a esse lugar e verificar o que lá existe, se naturalmente os espíritos mais elevados permitirem isso ao senhor.
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Pergunta nº 2: Impedido de reencarnar
Locutor - Professor, o ouvinte N. V., de Itaberaba, pergunta: poderia um espírito que tivesse perdido a chance de renascer pelo motivo de uma queda que sua futura mãe levou no período de gestação, esse mesmo espírito recolheria um outro corpo já em formação, sem passar pelo processo que se refere ao Livro dos Espíritos, capítulo sete, pergunta 344, local onde trata desse assunto. Um caso semelhante a esse eu ouvi no rádio, dia 10 de janeiro de 1974 às 9 horas.
J. Herculano Pires - Essa pergunta implica naturalmente uma apreciação do problema da reencarnação. Quando o espírito vai se reencarnar, ele é destinado a um corpo que ainda vai se formar. Acontece que esse corpo se forma sob a ação do próprio perispírito do espírito reencarnante, porque os dois, o espírito e o corpo, devem constituir na vida terrena uma unidade perfeita. Corpo e espírito ou alma e corpo apresentam-se na vida como uma unidade, estão perfeitamente ligados, perfeitamente entrosados, podemos dizer assim, célula a célula, de tal maneira que hoje, principalmente diante das descobertas científicas mais recentes no campo da biologia e da própria física, considera-se que o que nós chamamos perispírito ou corpo espiritual do homem, isso constitui um modelo, um modelo energético sobre o qual se constrói, por assim dizer, o corpo material. Por isso é que dizemos que o duplo etéreo das criaturas, esse duplo etéreo se manifesta, por exemplo, nos fenômenos de desdobramento, nos fenômenos de aparições; esse duplo etéreo representa uma espécie de duplicata do corpo material. Ora, sendo assim eu procuro esclarecer o problema e sei que o problema é complexo, muitas vezes há pessoas que reclamam que eu estou complicando muito o assunto. Não é verdade. O assunto é complexo e se não for bem explicado, ninguém entenderá. Então vamos esclarecer bem isso. Dessa maneira, quando um espírito vai se reencarnar, é destinado a ele não um corpo já feito na Terra, mas apenas uma possibilidade de fecundação de que ele vai participar. Quando se der a fecundação do óvulo e começar a se desenvolver a célula inicial do embrião, então o espírito estará presente e se ligará a ele, como vemos na explicação do Livro dos Espíritos. Dali por diante eles passam a constituir um processo único. Ora, sendo assim não é possível que num caso desses o espírito vá se servir de outro corpo já em desenvolvimento. Ele iria interferir num processo já em andamento com o qual não poderia estabelecer as ligações necessárias para formar a perfeita unidade que em medicina se chama hoje psicossomática, a unidade do psiquismo com a soma que é o corpo material. Não poderia fazer isso, de maneira que os casos que o senhor ouvir a respeito disso, são puramente hipotéticos, ninguém pode afirmar com absoluta segurança que isso aconteceu em algum lugar.
Assim também eu aproveito a oportunidade para deixar isso bem claro, porque há aí uma grande mistificação mundial que está dando muito lucro a quem a fez: é o caso de Lobsang Rampa. Ora, é impossível, é absolutamente impossível que o corpo de um lama do Tibet, por exemplo, como está escrito no caso de Lobsang Rampa, como ele se afirma ser, o espírito de um lama do Tibet venha reecarnar-se na Inglaterra no corpo de um inglês que está morrendo. Isso é um absurdo, um absurdo que não comporta nenhuma apreciação lógica do ponto de vista espírita e nem mesmo do ponto de vista biológico. Seria possível admitir-se que no organismo biológico já feito, já amadurecido, já velho, já chegou à decrepitude e à morte pudesse haver a reencarnação de um outro espírito. É claro que isso não pode haver. Então é bom que se fique sabendo que isso também é uma hipótese absurda, inaceitável pelo espiritismo.
Quanto à segunda pergunta que o senhor faz, se a alma do anima evolui só dentro da sua espécie ou passa de um reino para o outro, essa pergunta está implícita no problema da evolução. O senhor encontra no próprio Livro do Espíritos, na pergunta quinhentos e quarenta desse livro, uma resposta bastante esclarecedora. A resposta não trata propriamente desse assunto, mas no final da resposta, o espírito da verdade diz o seguinte: “admirável lei de harmonia, referindo-se a evolução, admirável lei de harmonia que a vossa mente ainda não pode conceber. Tudo se encadeia no universo, desde o átomo até o arcanjo que, por sua vez, já foi átomo”. O senhor pensando bem sobre isso verá que a evolução é um processo contínuo, sem nenhuma descontinuidade, que vai desde o reino mineral até o reino angélico.
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Pergunta nº 3: Religiões primitivas
Locutor - Professor, nosso ouvinte J. C. da S., da Freguesia do Ó, pergunta: na televisão passa um trailer de um documentário mostrando uma aldeia da África onde seus habitantes ainda sacrificam animais aos deuses. Nas grandes capitais, como São Paulo, Rio de Janeiro e outras, ainda se vê gente prestar culto a uma tal de Iemanjá. A juventude atual que se considera tão evoluída vive cheia de penduricalhos e amuletos. Por que ainda acontecem essas coisas quando se fala da proximidade do ano 2000? J. Herculano Pires - A proximidade do ano 2000 não cria nenhuma condição especial para a vida terrena. Apenas acontece o seguinte: o ano 2000 marca mais o início de terceiro milênio da era cristã. Veja-se bem, muita gente pensa que quando falamos no ano 2000, estamos falando da idade da Terra. Não é isso. O ano 1000 marcou o segundo milênio, o primeiro milênio começou com o ano um. Ora, depois do segundo milênio nós agora estamos no fim do segundo milênio, estamos em 1973, mais vinte e sete anos nós estaremos entrando no terceiro milênio. Então vem o ano 2000. O ano 2000 é simplesmente uma data cronológica, uma data marcando o tempo, não é uma data milagrosa, não é uma data marcada por um poder extraordinário, nada disso. Então a evolução que vem se dando, que vem se realizando nesse momento na Terra, continuará realizar-se a partir do ano 2000. Acontece que como o ano 2000 marca o início de todo um milênio, veja o senhor, são mil anos que vão nos levar do ano 2000 até o ano 3000. Durante esse milênio, a Terra evoluirá grandemente, e de acordo com as informações dos espíritos, a Terra passará durante esse milênio para um plano superior. Será um mundo mais civilizado, um mundo mais harmonioso, ideias mais generosas, mais espiritualistas dominarão o planeta. Então, haverá uma grande transformação, uma transformação extraordinária que elevará a Terra na escala dos mundos, ela que é hoje um mundo quase primitivo, ainda cheio de tantas dores, tantas provas, tantas misérias, ela passará por uma categoria de mundo mais evoluído, de mundo mais feliz, mas isso num processo de mil anos. Não é que no ano 2000, milagrosamente, como se uma varinha de condão pudesse transferi-la de um plano para outro, ela já desse um pulo e passasse para um plano superior. Não. É preciso que se tenha isso bem claro: o espiritismo não pensa em milagres, ele coloca os problemas sempre numa perspectiva histórica, numa evolução natural de todas as coisas. É nesse sentido que damos a entender. Agora, quanto a esse problema da televisão, eu não assisti esse programa, mas pessoas que assistiram já me falaram a respeito. Foi um documentário feito na África sobre as religiões primitivas da África. Essas religiões foram trazidas ao Brasil pelo tráfico negreiro, logo depois da descoberta do Brasil. Há mesmo historiadores que dizem que dezesseis anos após a descoberta já começou a vinda dos negros para o Brasil, trazidos aqui para trabalharem como escravos. Ora, cada leva de negros que vinha da África, e nós sabemos que essas levas eram caçadas praticamente nas matas e nos desertos da África como se os negros fossem animais, eram, portanto, populações selvagens da África, cada leva de negros que vinha e lá trazia consigo a sua própria religião, cada tribo africana tinha uma religião própria. Essas religiões, como todas as religiões primitivas em todo o mundo, essas religiões eram anímicas do ponto de vista sociológico, espiríticas do ponto de vista espírita. Por quê? Porque elas se baseavam na manifestação dos espíritos. A manifestação dos espíritos é a base de todas as religiões. As religiões primitivas tinham forçosamente de incluir esse elemento que é a manifestação dos espíritos, não propriamente a mediunidade, como nós falamos no espiritismo, mas o mediunismo que é uma qualidade natural da criatura humana, uma faculdade natural do homem. Ora, sendo assim essas religiões mediúnicas da África, essas religiões selvagens, vindas para o Brasil e misturando-se aqui com o catolicismo e com as religiões ameríndias, ou seja, as religiões dos nossos índios, essas religiões foram aqui se modificando e criando, tomando novo aspecto, desenvolvendo uma nova forma de religião que está nascendo. Então, nós temos hoje a umbanda, quimbanda, aruanda, o candomblé: são todas formas de religiões chamadas sociologicamente de sincretismo religioso afro-brasileiro. É natural que isso exista e que o nosso povo, também baseado nas suas superstições, nos seus costumes ainda antiquados, tenha também aceito, admitido essas coisas e passe a praticá-las, porque acredita na possibilidade dessas religiões solucionarem vários problemas espirituais que todo mundo tem. Nós, no espiritismo, consideramos isso um fato natural. O sincretismo religioso é tão natural que todas as grandes religiões do mundo são sincréticas, todas elas nasceram da mistura de uma religião com outras religiões.
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Pergunta nº 4: Rebeldia infantil
Locutor - Professor, o ouvinte G. S. P., ele pergunta: qual a atitude dos insetos em relação ao ser humano, principalmente a barata, a pulga e o pernilongo? E depois ele pergunta: por que as crianças de hoje são rebeldes?
J. Herculano Pires - Ora, seu Geraldo, é claro que esse problema foge completamente à nossa questão e à nossa pauta de estudos. Isso seria um problema para ser colocado do ponto de vista dos entomólogos, daqueles que estudam a vida dos insetos, mas do ponto de vista natural, comum a todos nós, nós sabemos qual é a atitude desses insetos com referência a nós. O senhor, por exemplo, nunca foi mordido por uma pulga? O senhor saberá naturalmente qual é a atitude da pulga com referência ao senhor e assim por diante. Mas deixemos isso de lado, porque a especialização não é nossa, e vamos tratar aqui desse problema das crianças. Por que as crianças de hoje são rebeldes, pergunta o senhor. O senhor acha que as crianças do passado não eram rebeldes também? Havia sempre a rebeldia das crianças, como há a rebeldia dos adolescentes, dos jovens. Sempre houve isso no mundo, em toda parte, em todas as sociedades do mundo. Então, por que dizemos hoje que as crianças de hoje são rebeldes? O que acontece é apenas o seguinte: em sociedades mais antiquadas, por exemplo, os nossos avós, os nossos pais podiam dizer: no meu tempo a gente olhava para a criança e só no olhar ela conhecia, ela compreendia, temia e obedecia. Por quê? Porque a educação era uma educação coercitiva, não era propriamente uma educação, era uma forma de domesticação. As crianças eram tratadas como seres rebeldes. A teologia católica, por exemplo, baseada em São Tomas de Aquino e, portanto, na filosofia oficial da igreja, chega a afirmar que as crianças devem ser tratadas com rigor, porque elas trazem o pecado original. Apesar do batismo, elas conservam os resíduos do pecado original e precisam ser tratadas com rigor para poderem se salvar, para não se tornarem pecaminosas. O resultado, como nós sabemos foi o contrário, quanto mais sujeitaram as crianças a processos coercitivos, agindo violentamente sobre elas, mais a humanidade se tornou explosiva, porque os recalques criados por essa falsa educação foram explodir nas gerações sucessivas, e as gerações de hoje, se apresentam algum aspecto de rebeldia que nos assusta, é porque hoje nós temos uma nova forma de educação no lar, na escola, em toda parte. Reconhecemos o direito da criança, o direito do adolescente, o direito do jovem e naturalmente essas crianças, esses jovens, esses adolescentes, todos eles trazem uma carga de repressão das encarnações anteriores que vem explodir nessa encarnação presente nesse momento no mundo. Essa pergunta sua, sim, está dentro do nosso temário.
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Participe do nosso diálogo radiofônico. Mande suas perguntas por escrito ao programa No Limiar do Amanhã: Rádio Mulher, Rua Granja Julieta, 205, São Paulo. Ouça as respostas nos próximos programas. Se não concordar com elas, conteste-as. Estamos no ar para dialogar. É conversando que a gente se entende.
Pergunta nº 5: Convivência com outros credos
Locutor - Professor, o ouvinte R. de Itaberaba, pergunta: não se trata de uma pergunta e sim de uma explicação e opinião. Que atitude deve tomar um espírita que convive com pessoas de outros credos e que dentre elas algumas são incrédulas? Nesse último caso procuram negar a existência de Deus e até mesmo de Cristo, taxando o próprio Kardec de tolo. Peço essa orientação para não chegar ao ponto de ofendê-los, mesmo porque eu considero o espiritismo o cristianismo redivivo.
J. Herculano Pires - Muito bem. O senhor considerando o espiritismo como o cristianismo redivivo, o senhor entende, naturalmente, que nós temos de agir como cristãos. O fato das pessoas serem incrédulas, de elas não aceitarem o espiritismo, de elas esposarem outras religiões não deve nos afastar delas. Jesus nunca fez essa diferenciação. No seu tempo, os judeus, como sabemos, consideravam os estrangeiros como bárbaros, eles chamavam mesmo “os goi” – os goi era uma expressão ofensiva. Pois bem, Jesus não tratou assim os estrangeiros. Os judeus detestavam os samaritanos, considerando-os hereges, perigosos e impuros. Entretanto, Jesus ensinou a parábola do bom samaritano, mostrando que um samaritano caridoso valia mais do que um rabino do templo de Jerusalém, o que foi um escândalo naquele tempo. Mas Jesus ensinou isso. Jesus não fazia diferenciação entre os homens, entre as criaturas humanas. Ele não se importava se a criatura acreditava nele, em Deus ou não. Ele ensinava, pregava, ajudava, esclarecia e orientava, é esse o nosso comportamento. Eu convivo com numerosas pessoas que não acreditam em nada, tenho muitos amigos materialistas, outros católicos, inclusive sacerdotes católicos que são meus grandes amigos e que eu quero muito bem, que eu os admiro. Cada um tem a sua maneira de pensar. Um mundo civilizado é um mundo em que a gente se entende, em que há a tolerância necessária de uns para com outros, a compreensão de que cada um tem o seu direito de pensar como quiser e de acreditar naquilo que ele pode acreditar. Não se acredita porque se quer. Muitas pessoas dizem eu tenho vontade de ter fé e não posso. É uma verdade, porque a fé não é uma determinação do indivíduo, ela é uma conquista, uma conquista que nasce do esforço do indivíduo para compreender a realidade. Assim, nós temos de conviver com todos nessa coexistência pacífica, podemos dizer assim, de acordo com a terminologia política atual, nessa coexistência pacífica que nos permite harmonia entre as criaturas humanas no trato de todos os problemas humanos. Sem isso não haveria sociedade. Veja-se, por exemplo, o que está se passando na Irlanda. Aquela tremenda guerra entre protestantes e católicos. De ambos os lados matam em nome de Deus. É possível isso? E pior ainda, matam em nome de Cristo, quando Cristo ensinou que não devíamos matar, mas sim ajudar, auxiliar as criaturas. Essa tem de ser a nossa atitude. Não se importe com que eles pensam, o senhor não toca em espiritismo quando conversa com eles. Nós não temos necessidade nenhuma de estar tocando em espiritismo com pessoas que não querem aceitar a doutrina. Se nós tocamos nisso, as provocamos. Então elas reagem, e com razão. Então nós não temos que tocar. Se elas fizerem perguntas, o senhor responderá, se não quiserem aceitar, o senhor não se incomoda com isso. Essa é a atitude que nós temos que seguir.
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Pergunta nº 6: Porque mudar de religião
Locutor - Professor, a ouvinte S. do V. M., que diz ter sido sua colega de escola primária em Avaré, pergunta: por que você largou a religião dos pais a que parecia tão apegado em criança para se tornar espírita? Ouço sempre os seus programas e percebo que a sua convicção é sincera. O que diria disso o padre Tavares? Lembra-se dele? Lembra-se de meu pai, Antônio Marinho, que foi muito amigo do seu? Os dois já morreram, não é? Você pode me dizer se teve alguma comunicação do espírito do seu pai e se o identificou de maneira indiscutível? Eu que continuo católica me contento em orar com muita saudade pela alma do meu pai. Você ora pelo seu?
J. Herculano Pires - É interessante, eu me lembro desse nome Marinho, mas para ser franco não me lembro do seu pai. Meu pai tinha muitos amigos. Provavelmente nesse tempo eu era muito criança, mas me lembro do nome Marinho lá em Cerqueira César, em Avaré, de maneira que, principalmente pelas suas referências, vejo que se trata de uma pessoa que realmente viveu lá. De fato, eu sou de família católica, nasci no catolicismo. O padre Tavares, o padre José Tavares que tem uma praça em Avaré com o nome dele, eu fui coroinha do padre Tavares, ajudei ele a rezar muitas missas e gostava muito do padre Tavares, eu era muito amigo dele e ele muito meu amigo. O padre Tavares morreu em Avaré. Avaré inteiro reverenciou a memória do padre Tavares e reverencia até hoje, que ele foi de fato um grande sacerdote, um grande homem, uma grande criatura. Quero muito bem o padre Tavares, mas isso não impede absolutamente que eu, ao ter conhecimento dos problemas espíritas e vendo que o espiritismo me dava as explicações que a religião de meus pais não podia me dar, e que o espiritismo abria uma perspectiva nova para a minha compreensão do homem, da vida, do mundo, e principalmente porque o espiritismo me dava uma visão que me parece muito mais real do evangelho, ele não estabelece contradições entre o texto do evangelho e o texto dos livros religiosos. Não. Aquilo que nós encontramos nos livros espíritas coincide com aquilo que está no evangelho. Então, vendo essa harmonia e percebendo tudo isso eu senti naturalmente o impulso que me impeliu para o espiritismo. E me tornei espírita. E sou como, você diz, sinceramente espírita, e acreditando não apenas por acreditar, mas por ter provas. Você me pergunta se meu pai deu comunicações. Deu. Eu tive comunicações inesperadas de meu pai através de médiuns que não o conheceram, comunicações que se confirmaram de maneira plena. Certa vez, numa rua de São Paulo, na Rua Marcone, eu me encontrei com José Tirapele, esse nome é real, José Tirapele era o nome dele, um padeiro de São Manuel, próximo a Botucatu, como todos sabem. Ora, o José Tirapele era muito conhecido em São Manuel, bastante conhecido, e ele era médium. Eu estava conversando com ele na porta de um bar, de um café, íamos tomar um café, ali na Rua Marcone, posso dizer até o café, o Café Columbia. Íamos tomar um café quando senti a influenciação de alguma entidade espiritual. Olhei para o Tirapele e vi que ele estava transfigurado, o seu rosto mudara a expressão. Perguntei a ele: há alguma coisa com você, Tirapele? Quem me respondeu não foi ele, foi meu pai dizendo que precisava falar comigo e que eu levasse o Tirapele à noite para a minha casa a fim de fazermos uma prece e que ele pudesse conversar tranquilamente comigo. Levei-o, com toda nossa família reunida, meu pai se manifestou. Eu pude identificá-lo evidentemente, porque a identificação veio das suas próprias palavras, da sua maneira de falar e inclusive da sua gesticulação, das suas expressões e Tirapele nunca conhecera meu pai, de maneira que tive essa prova. Quanto a orar pelo meu pai, como você ora pelo seu, é claro que oro. Então você não sabe que nós espíritas oramos por todas as criaturas que nós queremos bem tanto estando vivas na Terra quanto estando vivas no espaço? Para nós não há restrição nesse ponto. Pelo contrário, o espiritismo aprova inteiramente as preces pelos espíritos, pelos espíritos que nós queremos bem e pelos espíritos que nos querem mal, embora nós não os queiramos. Por todos nós devemos orar, tanto encarnados como desencarnados, porque a oração é uma vibração benéfica, uma vibração de amor que parte da nossa mente, do nosso coração em benefício daquela criatura.
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Pergunta nº 7: Inferno
Locutor - Professor, J. C., seu amigo de Cerqueira César diz que está passando uma temporada em São Paulo e ouve o seu programa. Gostaria que você me respondesse uma pergunta, escreve ele, que é a seguinte: cada criança que nasce é um espírito reencarnado. Desde que a Terra existe, esses espíritos estão reencarnando sem parar e o mundo continua o mesmo, não melhora nada. Por que Deus não manda logo esses espíritos para o inferno em vez de perder tempo com eles?
J. Herculano Pires - J. C., é engraçado Juvenal, será você mesmo o J. L. de C., mas por que você não pôs o L.? Ou não é você? É outro J. C.? Você sabe, a gente teve tantos amigos no interior, tantos amigos de infância, amigos de adolescência, amigos de mocidade, às vezes algum nome escapa e a gente confunde com outros, mas essa pergunta está bem do tipo do J. L., não sei se é você, o J. L. gosta dessas piadas. É claro que a pergunta, embora feita assim em tom de piada, ela é séria e eu vou responder seriamente. Cada criança que se encarna na Terra é uma reencarnação, está certo. São espíritos que vem se reencarnando há séculos, talvez a milênios, mas as suas primeiras encarnações foram rudes, foram grosseiras, foram brutais. Esses espíritos vêm se melhorando, vêm se desvencilhando dos resíduos animais, dos instintos animais que trouxeram das fases anteriores da evolução e vão se aprimorando, vão se humanizando. A reencarnação é um processo de humanização. Então, cada criança que nasce já está um tanto além daquele ponto da sua encarnação anterior. Todos evoluem e acontece o seguinte: quando os espíritos atingem um ponto de evolução que supera a condição normal da evolução terrena, que se eleva acima do nível da evolução terrena normal, esses espíritos não precisam mais se encarnar na Terra. Eles passam para planos superiores, para mundos mais elevados. É por isso que a Terra não melhora tanto quanto a gente deseja, porque na proporção em que esses elementos vão passando para outros planos, outros elementos inferiores vão também se encarnando na Terra. As dúvidas a respeito desse assunto decorrem de um conceito errôneo da humanidade. Em geral se pensa que a humanidade só existe na Terra. Não. A humanidade existe no cosmo, no universo infinito. Há milhares, milhões de mundos habitados. Então, assim como existem aqui na Terra as migrações entre os continentes, populações de um continente mudam para outro, pessoas de um continente vão morar em outro e assim por diante, também acontece isso entre os mundos do espaço. Os espíritos de Plotino, aquele filósofo da era helenística que foi discípulo de Platão, Plotino chamava os espíritos de almas viajouras, porque, diz ele, essas almas viajam pelo infinito. Assim, a humanidade, sendo cósmica universal, nós compreendemos melhor o problema da evolução terrena. Os espíritos que passam pela Terra estão passando por uma fase necessária e evolução ainda adstrita ao seu estado evolutivo. Mas apesar disso, globalmente, a humanidade terrena tem melhorado, tem evoluído e nós estamos avançando decisivamente para um mundo melhor.
Mas voltemos a sua piada, J. Por que Deus não manda depressa, de uma vez por todas esses espíritos para o inferno? Eu vou responder isso a você também. Por dois motivos. Você já leu Guimarães Rosa em “Grande Sertão Veredas”? Se você ler, vê lá uma hora em que Diadorim, o personagem do livro diz assim: Deus é paciência. É por isso, J., que Deus não manda esses espíritos de uma vez por todas para o inferno, porque ele é paciência, mas existe também um outro motivo e é mais importante ainda do que esse: é que o inferno não existe J.
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Pergunta nº 8: Racismo
Locutor - Professor, B. R. dos S., de Santos, escreve perguntando: sou negro e isso é uma desgraça. Apaixonei-me por uma moça branca e ela por mim, mas seus irmãos quase me mataram. Sou melhor do que eles em tudo, mas sou negro. Por que Deus me fez isso? J. Herculano Pires - Negro vaidoso, no duro viu B., negro vaidoso. Porque você mesmo diz aí que você é melhor do que eles em tudo, melhor do que os irmãos da sua namorada. Por que você é melhor em tudo? A vaidade aumenta as nossas possíveis desgraças. Você diz que ser negro é uma desgraça. Por quê? Negro é uma raça. Existe a raça branca, a raça negra, a raça amarela, a raça vermelha, todos são raças humanas e em cada raça, cada elemento dessa raça deve ter a coragem de integrar-se na sua própria raça e deve ter mesmo o orgulho de pertencer a essa raça, porque todas as raças têm o seu passado, todas as raças têm o seu acervo de conquistas morais, espirituais, intelectuais. Os negros representaram um papel muito importante na história do mundo em todos os tempos. Veja você, até Moisés teve uma mulher negra, sabe disso? Até Moisés teve uma mulher negra. Existem os judeus negros, você sabe disso também? Os judeus negros, quer dizer, no mundo inteiro os negros exerceram uma influência muito grande e muitas vezes foram grandes heróis. Você se lembra, por exemplo, daqui do Brasil, aqui da nossa história brasileira, da guerra holandesa? Você quer coisa mais linda do que aquilo que aconteceu na expulsão dos holandeses. Vidal de Negreiros, o branco, Felipe Camarão, o índio, e o negro, Henrique Dias. Os três, o negro, o índio, o branco conjugados para expulsar os holandeses, e todos eles não representaram cada um o seu papel dentro da sua raça com o vigor, a coragem, a bravura da sua raça? Deixa de bobagem, B. Nascer negro não é nada de mais, não é desgraça nenhuma a não ser para um negro vaidoso como você, ouviu? Corrija a sua vaidade. Considere-se igual aos outros, nem melhor e nem pior. Nós todos somos iguais. E vai tocando a sua vida. O problema da sua namorada, se realmente ela gosta de você e você gosta dela, será resolvido. É claro que será. O amor vence tudo, você não sabe disso? Mas não misture ódio com amor. Trate de enfrentar o problema convicto de que ser negro é ser homem e, portanto, você como homem pouco importa a cor da pele, você tem o direito de amar uma branca, uma amarela, uma preta, e ela também tem o direito de escolher o marido da cor que ela quiser. Compreende? A cor não influi em nada, o que vale é o espírito. Aprimore, portanto, o seu espírito B. Lembre-se de São Benedito e avance para frente.
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Pergunta nº 9: Auxílio
Locutor - Professor, I. de O. C., da Rua Estados Unidos, pergunta: se existem outros mundos habitados e civilizações mais adiantadas que a nossa, por que essa gente avançada não vem nos ajudar aqui na Terra? Acho isso muito estranho. Como o senhor explica isso?
J. Herculano Pires - Existem mundos adiantados e muito mais adiantados do que a Terra, mas é preciso você compreender o seguinte: quando, aqui mesmo na Terra, os continentes eram separados e as civilizações continentais eram chamadas civilizações ilhadas, porque estavam umas separadas das outras por falta de comunicação, de possibilidade de ligação de um lado do mundo com o outro, quando havia isso os povos mais civilizados da Europa, ao descobrirem a América, vieram aqui para civilizar a América, e a primeira coisa que fizeram foi arrasar com as civilizações indígenas que aqui estavam se desenvolvendo. Veja o que aconteceu, por exemplo, no México onde havia civilizações tão importantes como a dos Incas, a dos Maias. O que foi que aconteceu ali? Os espanhóis arrasaram com tudo. E arrasaram por quê? Porque descobriram que lá havia muito ouro, eles queriam dominar e queriam se enriquecer. Assim foi no resto da América. Se nos mundos acontecesse a mesma coisa, onde iríamos parar? A Terra é um dos mundos mais inferiores do espaço. Por isso Deus na sua sabedoria estabeleceu uma distância enorme entre os planetas, entre os mundos habitados para que eles só possam realmente se comunicar quando houver a evolução necessária para isso. Para vencer os espaços e atingir um mundo distante onde há civilização, é necessário que a Terra consiga uma elevação não só material, mas também espiritual e moral. Então, não irá tentar invadir e destruir outros povos. E assim também os mundos que conseguirem vir até nós, cujos habitantes conseguirem virem até a Terra, serão mundos tão adiantados que eles só poderão trazer realmente a civilização.
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Abrindo o evangelho ao acaso, encontramos o trecho seguinte: evangelho de Jo, 6:11-14.
Jesus então tomou os pães, e tendo dado graças, distribuiu-os pelos que estavam sentados; e do mesmo modo dos peixes quando queriam. Depois de saciados, disse Jesus a seus discípulos: recolhei os pedaços que sobejaram para que nada se perca. Assim os recolheram e encheram doze cestos de pedaços dos cinco pães de cevada que sobejaram aos que haviam comido. Quando o povo viu o milagre que Jesus fizera, dizia: este é, verdadeiramente, o profeta que há de vir ao mundo.
Esse trecho do evangelho de João que acaba de ser lido refere-se, naturalmente, como nós sabemos, como nós já vimos, ao fenômeno ou ao milagre da multiplicação dos pães e dos peixes por Jesus. Este é um problema muito controvertido no campo dos estudos evangélicos. Enquanto as religiões fincam pé, por assim dizer, no milagre, afirmando e sustentando que houve realmente a multiplicação dos pães e dos peixes, outros estudiosos, particularmente do ponto de vista das pesquisas universitárias sobre a história do cristianismo, preferem aceitar este texto como uma espécie de parábola, uma forma de ensino alegórico. Jesus teria apenas dito aos apóstolos e a todos aqueles que o ouviam que, por pouco que a pessoa possua para dar aos outros, pode aumentar ao máximo se pedir ao pai, se pedir a Deus e se confiar os poucos peixes e os poucos pães que cada um de nós traz no seu alforje às mãos do senhor. Porque as mãos do senhor poderão multiplicar o alimento para toda uma multidão. É claro que pode-se aceitar perfeitamente esse sentido alegórico, simbólico desse trecho evangélico. Dificilmente nós podemos separar nos evangelhos alguns elementos mitológicos e elementos simbólicos, alegóricos, dos elementos realmente históricos, porque é preciso não nos esquecermos de que os evangelhos nasceram, foram escritos, foram redigidos na era mitológica, sob influencia da cultura mitológica que dominava o mundo. Consequentemente, nós que agora vivemos na era histórica, sob uma cultura histórica, encontramos dificuldade para esclarecer certos problemas.
Kardec preferiu separar do evangelho apenas o ensino moral de Jesus, sobre o qual não há dúvidas nem contradições, para escrever o Evangelho Segundo o Espiritismo que é, ao contrário do que muita gente pensa, simplesmente um comentário das passagens morais do evangelho; não é um novo evangelho como querem dizer os adversários do espiritismo. Ora, no tocante a problemas como esse da multiplicação dos pães e dos peixes, Kardec preferiu tratar do assunto no final do livro A Gênese, quando ele trata dos milagres e das predições que figuram nos evangelhos. Kardec, naturalmente tratando deste assunto, admite a possibilidade de fenômenos mediúnicos de multiplicação, como nós podemos admitir dentro do espiritismo, mas não podemos afirmar com segurança que esse trecho do evangelho de João, que encontramos também em outros evangelhos, seja real do ponto de vista fenomênico. Talvez, como no caso da parábola da figueira que aparece num evangelho como parábola e noutro como realidade, isto aqui não passe de uma parábola muito bonita, ensinando uma verdade espiritual muito profunda.
O que é a verdade? É aquilo que é, não aquilo que vemos ou sentimos; não aquilo que supomos ou pensamos. Quem busca a verdade não se prende a dogmas, a ideias feitas, não se escraviza a princípios que lhe foram impostos pelos outros. No campo da verdade, a única autoridade é a própria verdade que se impõe por si mesma, pela sua evidencia. O que é a verdade sobre o homem, sua natureza e seu destino? Só a pesquisa e os fatos comprovados podem responder a essa pergunta.
No Limiar do Amanhã: só a verdade nos interessa.